Por faiança entendem-se "todos os corpos cerâmicos, independentemente da forma, revestidos a esmalte estanífero"1.
Publicações recentes, baseadas em "peças exumadas em contextos arqueológicos"2, permitem colocar, embora com alguma (in)certeza, a produção de faiança estanífera em Portugal, já a partir de finais do século XVI.
Publicações recentes, baseadas em "peças exumadas em contextos arqueológicos"2, permitem colocar, embora com alguma (in)certeza, a produção de faiança estanífera em Portugal, já a partir de finais do século XVI.
Ultimamente, as escavações arqueológicas e a arqueologia subaquática, muitas delas realizadas em diferentes zonas do mundo - tendo em conta os locais onde os Portugueses chegaram ou navegaram - deram, em termos de datação cronológica, um contributo precioso para esclarecer as muitas dúvidas que perduram e que, não obstante, continuam de difícil esclarecimento.
Reinaldo dos Santos apontou quatro grandes períodos para a faiança do século XVII, fazendo-os corresponder aos quatro quartéis do século. O segundo período, que apelidou de "áureo", era, em sua opinião, aquele que melhor expressava a produção deste século, porquanto foi, nessa época, o segundo quartel do mesmo, que passaram a inserir-se elementos decorativos portugueses numa ornamentação maioritariamente oriental. Em seu entender, teriam sido, então, também introduzidos na paleta cromática o manganés e o amarelo, surgindo temas decorativos nacionais relacionados com a Restauração, tais como soldados e brasões reais.
Reinaldo dos Santos apontou quatro grandes períodos para a faiança do século XVII, fazendo-os corresponder aos quatro quartéis do século. O segundo período, que apelidou de "áureo", era, em sua opinião, aquele que melhor expressava a produção deste século, porquanto foi, nessa época, o segundo quartel do mesmo, que passaram a inserir-se elementos decorativos portugueses numa ornamentação maioritariamente oriental. Em seu entender, teriam sido, então, também introduzidos na paleta cromática o manganés e o amarelo, surgindo temas decorativos nacionais relacionados com a Restauração, tais como soldados e brasões reais.
Inicialmente, a organização ornamental da faiança seiscentista denota profundas influências orientais, reproduzindo, com bastante fidelidade, a decoração da porcelana do período Wan-li, dado que a procura por parte das elites é muito forte, havendo, para esta produção cerâmica nacional, mercado certo, nomeadamente na Alemanha, onde se encontra grande número de exemplares.
No entanto, vão aparecer novos elementos decorativos nascidos da própria imaginação dos artistas pintores, que introduzem elementos externos à gramática oriental. Daí a inserção de temas de origem portuguesa, mantendo, no entanto, uma clara predominância decorativa oriental - soldados armados,escudos e figuras tipicamente ocidentais-, tendo em conta a recente independência face a Espanha.
Uma tão profícua diversidade de elementos ornamentais, permite a agregação em famílias decorativas: desenho miúdo, aranhões, faixa barroca, rendas, contas, conventual.
Uma tão profícua diversidade de elementos ornamentais, permite a agregação em famílias decorativas: desenho miúdo, aranhões, faixa barroca, rendas, contas, conventual.
Todas as peças que de seguida se apresentam são de dimensões reduzidas, variando entre os dezoito e vinte e dois centímetros. Contrastando com as de maiores dimensões - as peças de aparato, destinadas unicamente a ser vistas - revelam sinais de uso, permitindo concluir que eram efectivamente utilizadas pelos seus possuidores.
Prato oitavado, com Decoração de Desenho Miúdo, a azul cobalto, com contornos a vinoso de manganés. Uma cartela central, com a palavra ESCUTA, entre flores. Uma miscelânea de elementos vegetalistas e zoomórficos percorre a aba.
Esta família decorativa caracteriza-se por combinar elementos decorativos orientais e ocidentais, numa pulverização que se espraia por toda a superfície da peça.
Esta família decorativa caracteriza-se por combinar elementos decorativos orientais e ocidentais, numa pulverização que se espraia por toda a superfície da peça.
Pequeno prato com Decoração de Aranhões, a azul cobalto e vinoso de manganés. O nome desta família decorativa provém dos elementos decorativos das abas, os quais mais não eram que as interpretações feitas pelos artesãos da ornamentação oriental usada na porcelana chinesa.
Duas peças com Decoração de Faixa Barroca. A designação desta família decorativa atribui-se aos "objectos produzidos na segunda metade do século XVII, contendo uma faixa ou tarja decorada com folhas de acanto estilizadas"3. Para além dos pratos, foi também usada noutro tipo de peças, como canudos de farmácia e bacias de barba. Contêm as mesmas cores: azul de cobalto e vinoso de manganés: no primeiro, a letra F surge enquadrada entre vegetação; no segundo, uma paisagem com árvores e rochedos. Ambos apresentam, nas abas, cercaduras formadas por enrolamentos de folhas de acanto.
Pequeno exemplar com Decoração de Rendas. A flor central, unicamente em azul cobalto, mostra uma ornamentação densa e rica, de arcos e volutas, decoradas com rendas. Numa clara demonstração do horror vacui, o artista preencheu toda a superfície da peça.
O nome desta família decorativa tem, como provável origem, as rendas usadas no "vestuário português de quinhentos e seiscentos"4.
Decoração de Contas. Ao centro sobressai um coração asseteado, circunscrito por círculos concêntricos, entre grupos de três contas, inseridas num triângulo. A aba mostra o mesmo esquema decorativo. Os mesmos tons: azul cobalto e vinoso de manganés.
A temática desta família decorativa, datável essencialmente da segunda metade do século XVII, continuou a ser usada ao longo mesmo século. Mais não é que a interpretação feita pelos nossos oleiros de um tema da porcelana chinesa, a cabeça de um ruyi, exprimindo poder e boa sorte.
Uma faiança com uma ornamentação extremamente simples, conhecida por Conventual, uma vez que muitas destas peças procediam de encomendas feitas principalmente por conventos e personalidades ligadas a casas religiosas.
Apresentam uma decoração muito simples, na qual a ausência de ornatos é manifestamente demonstrativa de uma inspiração mais arcaica. O fundo é esmaltado de branco, nele sobressaindo o azul cobalto e, mais tarde, também o vinoso de manganés. Este tipo de faiança perdurou até meados do século XVIII.
Prato com as armas da Ordem de São Domingos ao centro, despojado de qualquer outra decoração.
Uma outra peça que, pelo singelo da ornamentação, também cabe nesta categoria. É um prato, talvez de produção exclusiva para a sua encomendante, "D. Thereza Maria". A inscrição do nome surge rodeada por uma grinalda de flores.
A faiança do século XVII constitui matéria de atracção irresistível, não só por representar historicamente o início da produção de faiança em Portugal como pela riqueza e diversidade das decorações oferecidas.
Agradeço ao seu proprietário a partilha das peças apresentadas.
1- Casimiro, Tânia de Oliveira e Alves " Faiança Portuguesa nas Ilhas Britânicas (dos finais do século XVI até inícios do século XVII)", dissertação de doutoramento apresentada à FCSU, UNL, 2010, texto policopiado.
2 -Tânia Manuel Casimiro "Faiança Portuguesa: datação e evolução crono-estilística", Revista Portuguesa de Arqueologia, volume 16, pág. 352.
3/4- Miguel Cabral de Moncada "Faiança portuguesa Séc. XV a XVIII", Scribe, 2008, págs.98 e 111.
Rafael Salinas Calado "Faiança Portuguesa", Correios de Portugal, 1992.