Bandeira? Fervença? Qual das fábricas! Atribuir a produção das faianças às respectivas fábricas torna-se uma tarefa ingrata. Certezas são poucas. Incertezas muitas mais.
Um pequeno conjunto com um elemento comum - o galo - mas em temáticas diferenciadas. Uns referenciam a força e a predominância masculinas, numa clara alusão à supremacia do homem sobre a mulher. Ideias vigentes na sociedade europeia desde tempos remotos, que reverenciavam a superioridade masculina face à fragilidade feminina. Seres superiores, quer física, quer intelectualmente, à mulher estava reservada a dedicação à família, a orientação/organização da casa e a representar condignamente o papel social que lhe era atribuído.
Este é, com forte probabilidade, um prato Bandeira. Esta fábrica produziu essencialmente modelos vulgares, de uso doméstico embora de riquíssima ornamentação. A sua decoração caracteriza-se por uma cercadura cheia, com folhas de carvalho bem recortadas e flores, numa composição cheia de cor e alegria. Usavam a estampilha, complementada por elementos de pincel, que completavam a cena interior do covo. Neste caso, aludindo a um provérbio popular "onde há galo não canta a galinha", numa clara referência à superioridade masculina, face à delicadeza feminina. Os provérbios, carregados de sabedoria popular, dizem, em parcas palavras, verdades evidentes (!!!).
Um prato de grandes dimensões, diferindo do anterior por apresentar uma guardadora de aves, função que normalmente competia às jovens, por ser um trabalho mais leve e de menor exigência. A mesma estampilha do anterior, embora simulando uma cena campestre. Uma árvore dá sombra, enquanto o casal de galináceos se comporta em conformidade com as exigências sociais: superioridade e submissão. Menos rico em colorido, apresenta uma cercadura leve, de pequenos malmequeres azuis. Atribuição (?) ... aceitam-se alvitres. Gaia?
Este prato, com possibilidade de ser atribuível a Fervença, apresenta uma cercadura com conjuntos de pétalas separadas por uma traço contínuo, ondulante, no verde esbatido desta produção. No covo, em destaque central, uma pequeno galo, impante e orgulhoso, pela função que lhe foi cometida: guardião da chave que une os dois corações. Ladeiam-no conjuntos de pétalas e folhas e rabiscos finos, traçados a ponta de pincel. Diz-nos Luiz A. de Oliveira que Fervença "fabricou louça de faiança muito bem laborada, proporcionando todos os materiais de primeira qualidade para a manufactura"1.
Aplica-se uma quadra popular, expressando em palavras, o sentir do autor da composição.
Aqui tens meu coração
E a chabe pro abrir
Num tenho mais que te dar
Nem tu mais que me pedir
1- Luiz A. de Oliveira "Exposição Retrospectiva de Cerâmica Nacional em Viana do Castelo", Porto, 1920, Pág.135.
Ivete
ResponderEliminarQue belas peças nos mostrou e que colorido. Adoro também estes temas mais populares com os galos e as galinhas, animais que no passado todos tinham nas traseiras das suas casas, fossem ricos, pobres ou remediados. A governanta do ditador Salazar, a D. Maria tinha uma capoeira em S. Bento e vendia ovos para fora pois era no bom governo da própria casa que começava a boa gestão das contas públicas. Estes pratos traduzem bem um tempo, em que o campo estava sempre presente, mesmo quando se vivia em plena cidade.
Bandeira e Fervença são sempre uma eterna trapalhada e talvez ainda seja necessário esperar mais tempo para termos mais certezas. Recentemente, comprei aquele livro sobre a faiança de Vilar de Mouros, que reproduzia umas malgas com uma decoração, que até há pouco tempo eu identificaria como Fervença. Relativamente aos seus pratos, só para o primeiro é que também arriscava um palpite, Bandeira, os outros dois ficava-me em Gaia ou no Porto. Agora que os seus três pratos são lindos e que fazem um belo conjunto, lá isso é bem verdade.
Um abraço