Este gracioso conjunto de peças inglesas marcadas Davenport, percorreu um longo caminho. De Inglaterra, passando por terras transmontanas, chegou a Lisboa, onde terminou o seu Grand Tour. Recorda os tempos bons da minha infância.
Desde sempre me lembro de os ver, integrados no conjunto do serviço, aprumados e elegantes, na cristaleira que lhes estava destinada, na casa da Avó Isabel, na Rua de Santa Catarina, nº1363, no Porto.
À entrada da casa, a Avó Isabel, com cinco dos seus netos. A garota sisuda, do laçarote e vestido de xadrez, sou eu.
Ainda hoje existe a casa. Rés-do-chão e primeiro andar. Albergava esconderijos fantásticos, que o pequeno cão, o Fox, revelava num ápice. Era o motivo das nossas queixas, pois não nos deixava gozar o prazer de estarmos escondidos tempo suficiente. Ainda consigo descrever a distribuição das várias divisões. O átrio tinha uma porta de guardavento, com vidrinhos verdes, que dava acesso ao andar superior. À esquerda ficava a sala de jantar, comprida, algo solene, com as paredes apaineladas de madeira. Ao fundo, no lado direito, a cristaleira com o serviço Davenport, só usado em dias de festa.
Para o meu Pai ficou um prato coberto e dois pratos.
De forma quadrangular,com tampa ovalada e bastante alta, o prato coberto revela uma decoração minuciosa, em tons degradés, de azul, que lhe conferem profundidade. O tema é um dos clássicos: as crianças, de feições caracteristicamente chinesas, brincando, inseridas na paisagem. Os jogos vão variando. O casario e a paisagem, porém, mantêm-se. As cercaduras, floridas e rendilhadas, envolvem toda a decoração. A pega da tampa, como que formando um arco, apresenta pequenos sinais: pontos e cruzes.
Imagem retirada da internet |
A marca é curiosa e lembra as primeiras peças marcadas pela fábrica. A palavra Davenport, em letras maiúsculas, foi usada a partir de 1805, acompanhada de uma âncora, incisa na pasta. O exemplar que herdei tem o número 77. Será um indicativo cronológico?
Os outros dois pratos, embora com tema afim, crianças a brincar, apresentam entre si algumas semelhanças na decoração floral das cercaduras. Devem, contudo, ser posteriores ao prato coberto, já que a marca é totalmente diferente e, temporalmente, atribuída ao último quartel do século XIX
Não é, pois, de excluir a hipótese de serem peças provenientes de dois serviços, um deles mais antigo e possívelmente da casa do meu Bisavô, João José Vaz de Morais Madureira Lobo, que vivia em Mirandela.
Imagem retirada da internet |
O Grand Tour terminou. A viagem foi longa e aliciante.
Bonitas peças. É uma pena que estes serviços sejam partidos nas heranças. Os meus irmão e eu fizemos isso com um faqueiro de prata e hoje acho que foi uma tolice. É preferível dividir por conjuntos, mas nem sempre tomamos as decisões acertadas.
ResponderEliminarGostei das peças que apresentou com as chinoiseries, que é outro dos temas recorrentes da faiança inglesa do século XIX. O Manel tem umas quantas peças semelhantes, mas tenho ideia que houve mais que uma fábrica a produzir estas decorações vagamente inspiradas na China.
Um abraço
Luís
EliminarTem toda a razão quando afirma que nem sempre se fazem as coisas certas. Então, em termos de partilhas, todos queriam ficar com uma recordação e o resultado eram lotes diversificados e incoerentes.
Por me lembrar de ver o serviço da minha Avó na armário da sala, sempre tive uma grande estima pelas peças que ficaram para o meu Pai. É uma ligação que conta uma história. A tal viagem de Inglaterra, passando por Trás-os-montes e finalmente aqui, onde são apreciadas pelas recordações que me trazem à memória.
Um abraço
Que bela imagem, para os meus olhos, inicia este poste!
ResponderEliminarE não posso deixar de salientar a beleza e a ternura da segunda, uma bonita composição de rostos e figuras que lhe trouxe queridas memórias familiares, particularmente as brincadeiras na casa da sua avó. Obrigada pela partilha.
Eu tenho um prato deste padrão da Davenport “Chinese pastimes”, mas não desdenharia ter a acompanhá-lo um bonito prato coberto como este que aqui mostra. Nestas peças maiores dos serviços há sempre uns pormenores do formato, as pegas, por exemplo, que me encantam especialmente.
Quanto às marcas, tanto quanto sei foram ambas usadas durante algumas décadas do séc. XIX, talvez dos anos 20 aos anos 50, por isso as peças podiam pertencer ao mesmo serviço e serem marcadas indiferentemente por um ou outro carimbo (?)
Um abraço
Gosto muito do conjunto que apresentei, não só pela sua beleza intrínseca, como também pelas memórias que me traz. Pode ser que, qualquer dia consiga fotografar as peças que estão na posse de primos. Pelo que sei, são pratos de sobremesa e uma terrina grande.
EliminarQuanto às marcas agradeço a sua douta informação. Ignorava que tinham sido usadas indiferentemente durante o mesmo período de tempo.
Um abraço
Ivete