Apresento este primeiro prato falante com a palavra "Amizade" para expressar a grande estima e consideração que me merece o seu proprietário, sempre disposto a debater hipóteses e dúvidas, esclarecendo-as com os seus amplos conhecimentos, no seu jeito minhoto, afável e simples.
António Pacheco no livro "Louça Tradicional de Coimbra 1869-1965", recentemente publicado, aborda o tema da cerâmica falante. Produzida nas olarias coimbrãs, era utilizada nas tabernas e casas pobres das aldeias das redondezas. Nela transparecia a alma simples das gentes que a usava e apreciava. Na sua génese poderão estar as faianças portuguesas seiscentistas, algumas com datas e dizeres característicos do período da Restauração da Independência, bem como o conhecimento das ceramiques parlantes, de origem francesa, executadas em larga escala entre 1789 e 1799, que tinham como principal função divulgar os ideais da Revolução Francesa.
Parte da colecção que mostro encanta o olhar e alegra a alma, pela sua cor, motivos decorativos e dizeres tão populares. Reunida pacientemente, mostra o gosto que leva muitos coleccionadores a procurarem os dizeres mais singelos, expressivos e invulgares.
- Num xe xabe
- Esta vida são dois sias
- Toma lá pinhões
- Talvez te escreva
- À beira do oçeano... e
- tantos outros
A faiança coimbrã, produzida em pequenas olarias, perdura no tempo, deliciando gerações de pessoas e integrando inúmeras colecções privadas. Usada nas casas e nas tasquinhas de Coimbra, onde a população estudantil se reunia para as suas tertúlias, estes pratos marcaram uma época muito própria e particular da vivência da cidade de Coimbra.
Ilustração Portuguesa, nº101, 27 de Janeiro de 1908 |
Num excelente artigo da Ilustração Portuguesa, de 27 de Janeiro de 1908, onde são caracterizadas as tascas da cidade de Coimbra, frequentadas pelos estudantes, encontram-se várias imagens de pratos falantes. Seleccionaram-se estes dois, significativos pelos seus dizeres:"Que bella pinga" e " Margens do Mondego".
Muitos coleccionadores - quem sabe ao longo de uma vida - dedicaram-se a reunir, amorosamente, os seus pratos. Foi o caso de António Capucho. O leilão da sua vasta colecção realizou-se em Dezembro de 2005, no Palácio do Correio Velho. Demonstra bem o criterioso cuidado do seu "ajuntamento".
Nas palavras de António Pacheco " mais raras, foram as travessas"1, pois a sua forma e decoração requintadas exigiam muito tempo e trabalho. Na travessa, com dois ramos de flores em posição oposta, podemos ler as palavras "Amor" e "Amo-te", inseridas em cartelas, rodeadas por flores.
Muitos outros motivos estiveram presentes nas mensagens destes pratos. Alguns para celebrar centenários, efemérides, ou simplesmente para ofertar em ocasiões especiais, como os casamentos.
Termino com muita amizade. Até um próximo post.
1 - António Pacheco "Louça Tradicional de Coimbra 1869-1965". Direcção- Geral do Património Cultural. Coimbra, 2015, pg:30.
Muito bom! Adorei o post e claro os pratos falantes!
ResponderEliminarMuito grata fico pelas suas simpáticas palavras. O tema das faianças agrada-me imenso e estas, com os dizeres tão simples, encantam pela sua beleza
Eliminaringenuidade.
Ivete
ResponderEliminarQuando a Maria Andrade anunciou no seu blog a publicação da obra de António Pacheco "Louça Tradicional de Coimbra 1869-1965", confesso que fui a correr comprar o livro e após a sua leitura consegui identificar numa assentada umas quantas faianças minhas e do Manel. É um livro, que embora sem pretensões a ensaio académico, é extremamente útil para todos os amantes da faiança ou pequenos museus municipais, pois aborda uma área quase virgem em termos de estudos, a segunda metade do século XIX e a primeira metade do século XX da produção coimbrã.
Estes pratos falantes tem uma certa candura, que por vezes ainda encontramos nas vendas à beira da estrada, vendendo fruta ou legumes, escritos num português oral e achei muita graça ter desencantado o artigo da Ilustração Portuguesa sobre as tascas de Coimbra. Quando me passam revistas antigas pela mão, também ando sempre à caça de anúncios ou textos sobre faiança, mas são realmente raros.
Um abraço
Luís
EliminarConcordo consigo quanto à oportunidade da obra de António Pacheco sobre a Faiança de Coimbra. Trouxe esclarecimentos e abriu imensas pistas para as inúmeras dúvidas que há sobre a nossa faiança.
A cerâmica falante com os seus dizeres e expressões são um encanto e mostram um lado da nossa cultura popular que, por si só, dava um estudo social interessante.
Também gosto de revistas antigas e, sempre que surge oportunidade e acessíveis em preço, lá aumenta a biblioteca e diminui o espaço em casa.
um abraço
if
Estas peças são um encanto, sobretudo no ingénuo e singeleza.
ResponderEliminarTendem a ser mais coloridas, pois parecem ser uma expressão mais vernácula da população rural.
Hoje, à semelhança do que foi acontecendo anteriormente com a loiça ratinha, já vai ingressando em coleções importantes, ganhando o seu estatuto e ocupando uma posição destacada.
Estas peças são sempre um encanto e trouxe-nos uma quantidade delas duma assentada só.
Como fiquei encantado com o livro sobre a faiança de Coimbra! Tal como o Luís menciona, já conseguimos decifrar (ainda que sem certezas absolutas, pois peças sem marca podem ser tudo e não ser nada) familiaridades com algumas das peças que tinha e que não fazia nem ideia donde poderiam ter surgido.
Há mais certezas, ainda que não absolutas.
Espero que tenham passado um bom tempo por terras nortenhas e que se encontrem bem
Manel
Manel
EliminarEstas expressões, por vezes com erros, quer de fonética, quer de grafia, têm um sabor todo particular. Como muito bem diz, também já vão ganhando estatuto para figurarem nas colecções particulares. Tenho visto alguns conjuntos em exposição nas paredes das casas. São um bálsamo para a vista.
O livro de António Pacheco sobre a Faiança de Coimbra, principalmente com a explicação sobre as fábricas, permite maiores certezas para as incertezas que nos atormentavam. Ainda bem que já conseguiu identificar algumas das suas peças.
Um abraço
if
Minha cara Ivete,
ResponderEliminarAcho sempre muito atraente esta faiança falante com origem coimbrã! E realmente a obra de António Pacheco veio lançar mais luz sobre este tipo de produção.Tenho apenas dois exemplares, mas ficam-me muitas vezes os olhos em alguns pratos deste tipo, que fazem uma bela coleção!
Achei muito interessante a foto e a referência à Illustração Portuguesa. Na verdade estas revistas antigas são preciosas para ilustrar diversos aspetos da vida portuguesa da época e neste caso foi um achado feliz.
Obrigada pela partilha. Espero que continue a presentear-nos com estas coisas bonitas.
Um abraço
Coimbra e a sua faiança têm cada vez mais encanto como na canção que a celebrizou. Ainda falta muita investigação e estudo para chegarmos a algumas certezas, mas o obra de António Pacheco foi um grande passo para lá se chegar.
ResponderEliminarAs revistas antigas, para além da graça de as folhear, por vezes dão-nos agradáveis surpresas, como foi o caso da Ilustração Portuguesa.
Quando nos presenteia a nós com um dos seus excelentes textos?
Um abraço