segunda-feira, 2 de maio de 2016

Passeio Avó e Neta ou prospecção de fragmentos de faiança

 
Num sábado de Abril, manhã cedo, mas já com o movimento de uma cidade muito apreciada pelos turistas, descemos a Rua Augusta, numa cumplicidade de avó e neta, dispostas a viver um programa dedicado às jovens.  Como pano de fundo o arco da Rua Augusta e a estátua equestre de D. José. A Catarina em pose . O objectivo era passear sem rumo, em passos (in)definidos, que nos levassem a nenhum lugar em especial. Mas, quase por um não acaso fomos ter à ...

 


onde um letreiro nos chamou a atenção: "Rainha Dona Amélia". O que fazia o nome da última rainha de Portugal num lugar, tão afastado do seu  tempo. Intrigadas pela curiosidade, entrámos e ...  



 

uma bela imagem nos marcou de imediato: a figura da rainha D. Amélia sobressaía numa das paredes do fundo. Se era uma confeitaria, alguma relação teria que haver com bolos. Gulosamente curiosas, com uma ideia a tomar forma, entrámos e ...



 
 
lá estavam, uniformemente dispostas, as Donas Amélias! O nosso apurado paladar saboreou, em antecipação, as iguarias expostas.
 
 

 
 
Depois de instaladas, conhecemos a história destas deliciosas queijadas.  São vendidas na Pastelaria "O Forno", que se situa em Angra do Heroísmo, Ilha Terceira.  Conta a tradição que "certo dia, D. Amélia, a Rainha, veio à ilha. As gentes da Terceira ofertaram-lhe os bolos melhores da rondura do seu horizonte. E em honra da rainha se chamam agora, Donas Amélias"1.
No ano de 1901, o casal régio deslocou-se em visita oficial aos arquipélagos da Madeira e Açores. Nos dias 2,3 e 4 de Julho do referido ano, visitaram a ilha Terceira. Terá sido num dos vários eventos do apertado programa a cumprir, que as diligentes Senhoras terceirenses terão apresentado as queijadas que, por terem sido elogiadas pela Rainha, dela receberam o nome. Em boa hora as provámos, pois são deliciosas.
 
 
Programa seguido pela família real na ilha Terceira. Para as diversas cerimónias vêm indicados os tipos de traje a usar. Curiosos são os pormenores detalhados, com a letra da rainha D.Amélia, para as diferentes toiletes a vestir de acordo com as diversas ocasiões. São mencionadas, também, as casas de modas ou as modistas que podiam ser "Fornecedoras da Casa Real", título muito cobiçado pelos proprietários, que gostavam de os exibir nas tabuletas identificativas das suas lojas, bem como nos cabeçalhos das facturas.
 
 
Dali partidas, rumámos ao Terreiro do Paço. Atrevida, tirou uma selfie. Serve de recordação, argumentava ela, na sabedoria e irreverência dos seus onze anos. Por que será que as avós se deixam convencer?
 
 
 
 
 
A mesma elegância! A mesma delicadeza! A mesma postura! A diferença está no sorriso.
 

 


A maré baixa permitiu-nos procurar, por entre as conchas e seixos, pequenos fragmentos de faiança. Uma amostra dos que encontrámos...


 
 
Entre todos o mais precioso (?) pela textura, pelo esmalte, pelo colorido bicromático: azul cobalto e manganés. Um pequeno fragmento de uma  possível peça malegueira (?), de arestas bem arredondadas, pelo roçar nas areias resultante do movimento das marés.





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Como mera hipótese, mostra-se um pequeno exemplar de faiança malegueira, cujos tons se aproximam dos exibidos pelo pequeno fragmento.



 
 
 
1 - Folheto publicitário "Bolos D. Amélia" da Pastelaria "O Forno". 
 
 
 
 
 
 
 

4 comentários:

  1. Os Açores tem das melhoras queijadas de Portugal e isto é um País de queijadas, pasteis e bolinhos. Logo em frente à Terceira, na ilha Graciosa fabricam-se umas queijadas com o nome da ilha, que para mim são as melhores do País. Tem um ingrediente qualquer exótico, que não identifico, talvez mel de cana que lhes dão um sabor fora de série. Nunca fui à Graciosa, mas simpatizo imenso com a ilha, pois penso sempre que quem faz queijadas tão boas, tem que ser boa forçosamente boa gente. O coração dos outros conquistasse pelo estomago e preparar um manjar, um bolo ou uma sobremesa é um acto de bem querer.

    A Maria Isabel do blog das faianças também é visita frequente das prainhas em frente ao Terreiro do Paço e tem descoberto, muitos cacos de antigas faianças. Quem sabe os tesouros que estarão ainda lá por baixo?

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    1. Luís

      A nossa doçaria tradicional é, para além de deliciosa e criativa, magnífica. Onde menos se espera, encontram-se verdadeiras delícias, quer pelo sabor, quer pelo apelativo da cor.
      Quanto à prainha frente ao Tejo, num dia de temperatura amena, é uma maravilha procurar fragmentos de faianças. Com os achados, vamos dar-lhes novos usos, recorrendo à nossa imaginação.

      Um abraço

      if

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  2. É uma das formas para conhecer o local onde se vive, caminhando-o, saboreando-o e sentindo o prazer de se pertencer a algum sítio, conhecendo-lhe a história, os recantos, acumulando memória.
    Uma forma muito saudável para a descoberta.
    E refere aqui uma das poucas rainhas a quem a história me ensinou a respeitar, e até mesmo simpatizar, pelo muito que fez por este país que nem sequer era o seu.
    Mulher que incentivou a criação de instituições destinadas à promoção das condições de saúde - tanto a assistência aos tuberculosos como o serviço de socorros a náufragos ou a entrada do Instituto Pasteur em Portugal à sua iniciativa se devem - que na altura não eram assim tantas, para não falar da cultura, pois o nosso Museu dos Coches é igualmente da sua iniciativa; e não quero também deixar de frisar que foi uma mulher que soube igualmente honrar o seu lugar de destaque na sociedade portuguesa, como mãe, esposa e educadora, pois possuía uma cultura apreciável. Não é por acaso que Manuel II tenha sido um destacado bibliófilo e, como bibliógrafo, se tenha dedicado à escrita versando a nossa literatura medieval e renascentista. Um homem igualmente interessante.
    Por tudo isto, considero que em boa hora a trouxe aqui.
    Estou certo que continuará estes seus passeios por muitos e bons anos, pois esta cidade é fabulosa e a sua história presta-se à descoberta.
    Manel

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  3. Manel

    Tem toda a razão acerca dos recantos de Lisboa, que só através os passeios pedestres permitem descobri-la e reinventá-la.
    Também aprecio a figura da rainha D. Amélia, tão injustamente tratada por algumas pessoas da época. Foi uma figura exemplar, como pessoa, como mãe e como Mulher. O tempo se encarregará de lhe fazer justiça.
    Outros passeios se proporcionarão. Depois daremos conta em jeito de reportagem.
    Ivete

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