Fui "fazer ... a Avenida"
Esta expressão teve origem num português acabado de chegar de Paris. Apareceu no Chiado, "trazendo no fato um pouco do aroma das acacias do Bois de Boulogne, nas maneiras um ar de blasé de clubman parisiense, na linguagem uns gallicismos terriveis que faziam desesperar o indigena, e um tanto aborrecido com esta boa terra que não sabia explorar o seu belo Tejo e o seu magnifico sol, bocejando em procura de qualquer cousa que lhe suavisasse as maguas pela terra que deixara, exclamava para o grupo de amigos que o rodeavam:
Rapazes, vamos fazer ... a Avenida. E descendo o Chiado, arrastando consigo uns mais corajosos que se arriscavam a sair da porta do Baltresqui ou do Magalhães, ele ia todas as tardes ... fazer a Avenida."1
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Imagem retirada da internet |
Era este um dos acontecimentos maiores da sociedade de Lisboa no raiar do século XX. Todos, damas e cavalheiros, se passeavam na Avenida, como era de bom tom nessa época. Circulando calmamente por entre as frondosas árvores, comentavam os últimos gritos da moda vinda de Paris ou os discursos proferidos na Câmara dos Deputados.
O velho Passeio Público já não satisfazia as necessidades dos lisboetas, no que dizia respeito às diversões. O projecto da Avenida veio substitui-lo. A sua concretização é entregue a Ressano Garcia que, tendo estudado em Paris, se vai inspirar nas concepções urbano-paisagísticas de Georges-Eugène Haussmann. Foi este que levou a cabo a renovação da capital francesa: parques, praças e avenidas arborizadas rasgam-se e integram-se na malha urbana. A sua acessibilidade acompanha o rápido sucesso que os novos "quartiers" alcançaram.
As antigas concepções do passeio mundano, murado e reservado para as elites, são esquecidas.
O velho Passeio Público já não satisfazia as necessidades dos lisboetas, no que dizia respeito às diversões. O projecto da Avenida veio substitui-lo. A sua concretização é entregue a Ressano Garcia que, tendo estudado em Paris, se vai inspirar nas concepções urbano-paisagísticas de Georges-Eugène Haussmann. Foi este que levou a cabo a renovação da capital francesa: parques, praças e avenidas arborizadas rasgam-se e integram-se na malha urbana. A sua acessibilidade acompanha o rápido sucesso que os novos "quartiers" alcançaram.
As antigas concepções do passeio mundano, murado e reservado para as elites, são esquecidas.
Também eu fui... fazer a Avenida. A Feira de Velharias da Avenida. Desta vez em pleno século XXI, mas com imagens e objectos pertencentes ao passado.
Embora a feira se distribuísse unicamente pelo lado direito de quem desce - compare-se, à esquerda, com o lado oposto - era grande e tinha muitos expositores. De tudo, um pouco se podia apreciar.
Um belo e bom conjunto de molduras, das quais sobressai uma, Arte Nova, com os seus elegantes enrolamentos exibindo, ainda, a fotografia de um senhor.
Um rapaz ainda novo, coleccionador de brinquedos antigos, mostrava garbosos soldadinhos de chumbo, dispostos em posição de combate. Mais abaixo uma outra banca com brinquedos do meu tempo.
Num outro vendedor, algumas faianças portuguesas, das quais ressaltava esta, pela sua elegância e cor.
Um outro mundo, antigo, que vive de memórias, acarinhadas por alguns, felizmente.
O matraquear das máquinas faz coro com as notas da concertina e o ritmo do sapateado.
Para terminar, um presente para um feliz (desde a véspera já não angustiado) e orgulhoso adepto do Belenenses - o meu marido.
Moura Cabral, "Lisboa: Crónica Elegante", 1886